segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Amor.


Enfim, aos quase 60, antes tarde do que nunca, ele experimentara o amor. Ou melhor, o Amor. Não que não houvesse amado até então. Certamente amara. Mas era um tipo de amor por obrigação. Amor de filho, amor de pai, amor de marido. Amores obrigatórios. Ai dele, se não sentisse! No entanto, a vida passara e ele nunca se arriscara num simples: eu te amo. Todas essas pessoas, pais, filhos, mulher, deveriam contentar-se com gestos carinhosos. Palavras de amor, nunca! Para ele, era como meter-se em um território desconhecido, uma rua sem saída. Era como se, uma vez ditas tais palavras, para sempre houvesse uma dívida a pagar. Ele se sentiria um cafajeste, um mentiroso, um crápula... afinal, o que era o amor? Que espécie de sentimento era esse, tão falado e tão pouco palpável? Dizia de brincadeira, mas não sem um pouco de verdade, que detestava a humanidade, o ser humano. Eis que de repente, sem que pudesse dar-se conta, estava amando. E de verdade. Amor daquele mais puro, mais profundo. Aquela garotinha, tão pequenina e tão gorducha, nunca poderia imaginar o impacto que causara. Seu sorriso de dois dentinhos, sua carinha feliz. Ali estava o Amor. Nela residia o encantamento.